Por Germano Oliveira – ISTOÉ
Fernando Haddad não foi escolhido pelo
presidiário Lula para substituí-lo na corrida presidencial por acaso.
Ele carrega o mesmo DNA dos malfeitos de seu padrinho político
encarcerado na Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba, desde
abril. O candidato do PT à Presidência responde a 32 processos na
Justiça, que o colocam como um dos campeões da ficha de ilícitos
cometidos na vida pública. Na extensa folha corrida, Haddad, já réu em
dois processos, é acusado de receber dinheiro de caixa dois de
empreiteira condenada na Operação Lava Jato, denunciado por crimes de
improbidade administrativa, suspeito de superfaturamento de obras e
serviços, acusado pelo desvio de recursos e até da aplicação ilegal de
dinheiro público. Não bastasse seu envolvimento direto em inúmeras
irregularidades, o presidenciável petista se cercou na campanha rumo ao
Palácio do Planalto, a mando de Lula, de assessores e coordenadores
igualmente processados por crimes no Petrolão, dando indicativos
concretos de que o partido reativará – num eventual futuro governo – a
máquina de corrupção azeitada durante os 13 anos de PT no poder. Pior.
Além do risco de retrocesso ético, a eleição de um novo poste de Lula
para o cargo de presidente resgatará a ameaça da ineficiência e da
incompetência administrativa que marcou a gestão de Haddad tanto à
frente da Prefeitura de São Paulo, como do Ministério da Educação.
Dinheiro de caixa dois
Formado em Direito pela tradicional
Faculdade do Largo do São Francisco, Haddad sempre alardeou pautar sua
vida pública pelo caminho da retidão. A narrativa, como quase tudo no
PT, não pára em pé. Basta jogar uma lupa sobre sua vida pregressa para
se perceber que o presidenciável petista é lobo com cútis de cordeiro –
ou seja, encontra-se tão encrencado quanto seus padrinhos políticos
petistas. A Kurier Analytics, uma empresa de gestão de informações
jurídicas, foi quem levantou, a pedido de ISTOÉ, a ficha corrida de
Haddad na Justiça e catalogou a existência de 31 processos contra o
ex-prefeito, apurando o número da ação, a vara em que está ajuizada a
causa e os motivos dos procedimentos. A reportagem acessou um por um dos
processos. Na relação, apenas não constava a 32ª ação contra o petista,
por correr na Justiça Eleitoral. Versa sobre o recebimento de caixa
dois na campanha a prefeito em 2012 e cuja denúncia, formulada pelo
promotor Luiz Henrique Dal Poz, foi aceita pelo juiz Francisco Shintate.
Como desdobramento da operação Lava
Jato, o ex-prefeito é acusado de ter recebido, em 2013, R$ 2,6 milhões
da Construtora UTC para o pagamento de uma dívida contraída junto a
gráficas. O dinheiro não foi contabilizado e chegou ao PT por meio do
doleiro Alberto Youssef, segundo delação do ex-presidente da empreiteira
Ricardo Pessoa. Como contrapartida, a Constran, do grupo UTC, ganhou
uma licitação de R$ 417 milhões promovida pelo prefeito para a
construção de um terminal rodoviário em Itaquera, segundo denúncia do
promotor Marcelo Mendroni.
As contas de campanha de Haddad, na
verdade, sempre foram uma espécie de caixa de Pandora do petista. Na
campanha à reeleição para prefeito em 2016, Haddad ficou devendo R$ 2,1
milhões para o publicitário Giovane Favieri, da F5BI, em razão da
locação de equipamentos de edição de vídeos. Favieri, investigado pela
operação Lava Jato por receber dinheiro sujo em campanhas eleitorais,
inclusive para o PT, entrou na 6ª Vara Cível com ação para receber o
débito. No último dia 16 de agosto, o PT fez acordo para ele receber o
dinheiro em parcelas até 2020. O mais suspeito, contudo, é que, no
último dia 25, Favieri recebeu outros – ou seriam os mesmos? – R$ 2,1
milhões oriundos do caixa da campanha presidencial de Haddad, conforme
registrado no TSE, também a título de locação de equipamentos para
edição de vídeos.
Haddad parece mesmo não gostar de jogar
às claras com a Justiça Eleitoral. Em declaração de bens obrigatória ao
TSE, o presidenciável atesta que o apartamento em que reside em São
Paulo vale a pechincha de R$ 90 mil. No Cartório de Registro de Imóveis,
porém, consta que ele declarou ter pago R$ 120 mil pelo imóvel em 1998 e
realizado um investimento de mais R$ 20 mil na compra de uma garagem,
esta não declarada pelo presidenciável. O valor venal do apartamento é
de R$ 997,9 mil – mais de 10 vezes a quantia orçada pelo candidato
petista ao TSE.
Entre as dezenas de processos aos quais
Haddad responde na Justiça, a maioria é composta por pelo menos 15 ações
populares e nove por improbidade administrativa. Em uma delas, Haddad é
acusado de superfaturar a ciclovia que liga o Ceagesp ao Ibirapuera, ao
custo de R$ 54,7 milhões. Cada quilômetro custou para a Prefeitura R$
4,4 milhões, bem acima do preço pago numa ciclovia na mesma região
durante a gestão do ex-prefeito Gilberto Kassab, — R$ 617 mil por
quilômetro. Nesse caso, o juiz Kenichi Koyama, da 11ª Vara da Fazenda
Pública, já aceitou a denúncia e Haddad virou réu. Ele é acusado também
de superfaturar a compra de salsicha para a merenda escolar. O
Ministério Público Estadual o acusa ainda de desviar R$ 129,2 milhões de
verbas destinadas ao Teatro Municipal. Nesse processo, estão envolvidos
ex-assessores diretos de Haddad.
Não bastassem os processos, o candidato
do PT ao Planalto acumula uma grande rejeição entre o eleitorado – acima
de 40% segundo as últimas pesquisas de intenção de voto. A reprovação
segue em curva ascendente. A aversão ao seu nome por parte do eleitor
não constitui propriamente uma novidade. Haddad experimentou o
infortúnio em 2016, quando acabou perdendo para João Doria (PSDB) no
primeiro turno. Atualmente candidato ao governo do Estado, Doria
desenvolve uma explicação para o baixo desempenho do ex-prefeito. Guarda
relação com a fama de laborfóbico do candidato do PT à Presidência.
“Ele não gostava de trabalhar. Chegava à Prefeitura às 10h e ia embora
às 18h. Nos finais de semana não aparecia”, disse o tucano. Num rápido
balanço de sua gestão, percebe-se que o petista deixou de cumprir grande
parte das promessas feitas ao assumir o cargo. Prometeu construir 243
creches e só entregou 38. Prometeu erguer três novos hospitais, mas
nenhum deles abriu as portas. Disse que iria construir 55 mil casas
populares e só levantou 10 mil. O déficit de professores aumentou de
1.800 para 4.700 ao final de seu mandato. Um desastre.
Fraudes no Enem
A passagem de Haddad pelo comando do
Ministério da Educação também foi marcada por intempéries. Desde a
polêmica criação do chamado “kit gay” às fraudes na aplicação do Enem,
que provocou um prejuízo de R$ 30 milhões aos cofres públicos. Logo no
início de sua gestão, o petista virou alvo das primeiras reprimendas dos
órgãos fiscalizadores. Uma ação da Controladoria Geral da União (CGU)
detectou uma verdadeira “farra das passagens” no ministério. Conforme o
relatório da CGU, em 2005 foram desembolsados R$ 3,3 milhões, um valor
R$ 932 mil acima do teto estabelecido. “O gestor (Haddad) não adotou as
providências necessárias para limitar os gastos com diárias e passagens,
desconsiderando a Portaria da Subsecretaria de Planejamento e Orçamento
– SPO”, descreve a CGU. Ainda segundo a auditoria a qual ISTOÉ teve
acesso, a Controladoria fez uma análise minuciosa de gastos de 16
servidores, entre os quais Fernando Haddad, relacionada ao exercício
financeiro de 2005 do MEC. O que a CGU descobriu é que o compromisso com
a coisa pública não é uma máxima no petista. Para camuflar o péssimo
desempenho no ministério, Haddad investia pesado em propaganda. Os
gastos saltaram de R$ 9,5 milhões, em 2005, para R$ 30,1 milhões, em
2012.
Mesmo com uma gestão atabalhoada à
frente do MEC, Haddad se manteve no cargo por sete anos, dois dos quais
já no governo Dilma, que chegou a pensar em substituí-lo por Marta
Suplicy. Mas Haddad era intocável. O petista só deixou o ministério em
2012, convencido por Lula a disputar a Prefeitura de São Paulo. Para
catapultar Haddad novamente, desta vez ao posto de mandatário do País,
Lula fez as vezes de tutor e coordenador informal da campanha. Conforme
antecipou ISTOÉ na última edição, Lula montou um verdadeiro QG na
cadeia, de onde articulou a cooptação de caciques do Nordeste e
determinou até repasses de dinheiro, em troca do apoio de lideranças
regionais a Haddad. Para torná-lo mais palatável ao núcleo duro petista,
Lula o orientou a se inscrever na corrente majoritária do PT, a
Construindo um Novo Brasil (CNB). Depois, destacou petistas de sua
confiança para o assessorarem – todos investigados ou processados pela
Justiça.
O tesoureiro da campanha petista é
Francisco Macena, vereador do PT e que responde ao lado de Haddad pela
acusação de recebimento de R$ 2,6 milhões da UTC para o pagamento de
dívidas da campanha à prefeitura paulista em 2012. A ex-presidente Dilma
Rousseff, uma das acusadas pelo STF como integrante do “quadrilhão do
PT, coordena a campanha em Minas Gerais, onde é candidata ao Senado. A
senadora Gleisi Hoffmann, presidente do partido, também investigada na
Lava Jato, é quem toca a campanha no Paraná. Outro que exerce papel de
destaque é ex-presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, que
responde a duas ações de improbidade por prejuízos à estatal. Completam o
time o presidente do Instituto Lula e o mais fiel escudeiro de Lula,
Paulo Okamoto, Gilberto Carvalho, ex-chefe de gabinete de Lula
investigado na Operação Zelotes, o ex-presidente nacional do PT, Ricardo
Berzoini, e Lindberg Farias, candidato do PT ao Senado pelo Rio –
velhos conhecidos das páginas político-policiais que regressarão ao
poder, se Haddad eleito for.
Comentários
Postar um comentário