Veja por que pessoas vacinadas ainda precisam usar máscara

 

Foto: Joel Saget/AFP

As novas vacinas para a covid-19 da Pfizer e da Moderna parecem ser extremamente boas na prevenção de quadros graves da doença. Mas não está claro o quão bem elas irão conter a propagação do novo coronavírus.

Isso porque os testes da Pfizer e da Moderna rastrearam apenas quantas pessoas vacinadas adoeceram com covid-19. O que deixa em aberto a possibilidade de que algumas pessoas vacinadas sejam infectadas sem desenvolver sintomas e possam transmitir o vírus silenciosamente – sobretudo se entrarem em contato próximo com outras pessoas ou pararem de usar máscaras.

Se as pessoas vacinadas espalham silenciosamente o vírus, elas podem mantê-lo circulando em suas comunidades, colocando em risco aquelas que não foram vacinadas.

“Muitas pessoas estão pensando que, depois de vacinadas, não precisarão mais usar máscaras”, disse Michal Tal, imunologista da Universidade Stanford. “Será muito importante para elas saber se terão que continuar usando máscaras, porque ainda podem ser contagiosas”.

Na maioria das infecções respiratórias, incluindo a do novo coronavírus, o nariz é a principal porta de entrada. O vírus se multiplica rapidamente ali, pressionando abruptamente o sistema imunológico a produzir anticorpos que são específicos da mucosa, o tecido úmido que reveste o nariz, a boca, os pulmões e o estômago. Se a mesma pessoa for exposta ao vírus uma segunda vez, esses anticorpos, bem como as células imunológicas que se lembram dele, desativam rapidamente o vírus no nariz antes que ele tenha a chance de se alojar em outras partes do corpo.

As vacinas contra o novo coronavírus, por outro lado, são injetadas nos músculos e rapidamente absorvidas no sangue, onde estimulam o sistema imunológico a produzir anticorpos. Isso parece ser proteção suficiente para evitar que a pessoa vacinada adoeça.

Alguns desses anticorpos irão circular para a mucosa nasal e ficar de guarda lá, mas não está claro quanto dos anticorpos podem ser mobilizados ou com que rapidez. Se a resposta não for “muitos”, o vírus pode se desenvolver no nariz – e ser espirrado ou expirado, infectando outras pessoas.

“É uma corrida: vai depender se o vírus pode se replicar mais rápido ou se o sistema imunológico pode controlá-lo mais rápido”, disse Marion Pepper, imunologista da Universidade de Washington em Seattle. “É uma questão muito importante.”

É por isso que as vacinas via mucosas, como o spray nasal FluMist para a influenza ou a vacina oral contra a poliomielite, são melhores do que as injeções intramusculares no combate aos vírus respiratórios, disseram os especialistas.

A próxima geração de vacinas contra o novo coronavírus talvez induza à imunidade no nariz e no resto do trato respiratório, onde é mais necessária. Ou as pessoas podem receber uma injeção intramuscular seguida por um reforço na mucosa que produz anticorpos protetores no nariz e na garganta.

As vacinas contra o novo coronavírus provaram ser poderosos escudos contra quadros graves da doença, mas isso não é garantia de sua eficácia no nariz. Os pulmões – o local dos sintomas graves – são muito mais acessíveis aos anticorpos circulantes do que o nariz ou a garganta, tornando-os mais fáceis de proteger.

“Prevenir quadros graves da doença é mais fácil, prevenir o quadro moderado e todas as infecções é o mais difícil”, disse Deepta Bhattacharya, imunologista da Universidade do Arizona. “Se é 95% eficaz na prevenção de doenças sintomáticas, será algo menos do que isso na prevenção de todas as infecções, com certeza.”

Ainda assim, ele e outros especialistas disseram estar otimistas de que as vacinas suprimiriam o vírus o suficiente até mesmo no nariz e na garganta para evitar que aqueles imunizados o transmitissem a outras pessoas.

A AstraZeneca, que anunciou alguns dos resultados de seus testes em novembro, disse que os voluntários tinham sido testados regularmente para o vírus e que esses resultados sugeriam que a vacina poderia prevenir algumas infecções.

A Pfizer testará um subconjunto dos participantes do ensaio clínico para anticorpos contra uma proteína viral chamada N. Como as vacinas não têm nada a ver com esta proteína, os anticorpos contra a proteína N revelariam se os voluntários foram infectados com o vírus após a imunização, disse Jerica Pitts, porta-voz da empresa.

A Moderna também planeja analisar o sangue de todos os seus participantes e testá-los para os anticorpos contra a proteína N.

“Levará várias semanas até que possamos ver esses resultados”, disse Colleen Hussey, porta-voz da Moderna.

Os testes até agora analisaram apenas sangue, mas testes de anticorpos na mucosa confirmariam se os anticorpos podem chegar até o nariz e a boca. A equipe de Michal Tal está planejando analisar amostras de sangue e saliva correspondentes de voluntários nos testes da Johnson & Johnson para ver como os dois níveis de anticorpos se comparam.

Enquanto isso, disse Bhattacharya, ele se sentia animado pelo trabalho recente que mostrou que as pessoas que receberam uma vacina contra a gripe de modo intramuscular tinham anticorpos abundantes no nariz. E um estudo de pacientes com covid-19 descobriu que os níveis de anticorpos na saliva e no sangue eram muito semelhantes – sugerindo que uma forte resposta imunológica no sangue também protegeria os tecidos da mucosa.

Espera-se que apenas pessoas com vírus em abundância no nariz e na garganta transmitam o vírus, e a falta de sintomas nas pessoas imunizadas que foram infectadas sugere que a vacina pode ter mantido os níveis do vírus sob controle.

Mas alguns estudos sugeriram que mesmo pessoas sem sintomas podem ter grandes quantidades do novo coronavírus em seu nariz, observou Yvonne Maldonado, que representa a Academia Americana de Pediatria em reuniões federais do Comitê Consultivo de Práticas de Imunização. A primeira pessoa confirmada como reinfectada com o novo coronavírus, um homem de 33 anos de Hong Kong, também não apresentou sintomas, mas tinha vírus suficiente para infectar outros indivíduos.

Pessoas vacinadas que têm uma carga viral alta, mas não apresentam sintomas “seriam, de certa forma, propagadoras ainda piores porque podem estar sob uma falsa sensação de segurança”, disse Maldonado. / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

Estadão

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